domingo, 15 de janeiro de 2012

Indicadores sociais na contramão do crescimento econômico

      Estudantes protestam em Brasília pela ampliação dos investimentos em educação

Embora ocupe o posto de sexta maior economia do mundo, Brasil apresenta índices de educação, saúde e inovação muito aquém dos países ricos da OCDE


GAZETA DO POVO - Publicado em 08/01/2012 | Anderson Gonçalves


Mesmo tendo sido considerado no fim do ano passado a sexta economia mundial, o Brasil passaria vergonha se ingressasse na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), apelidada de “clube dos países ricos”. Enquanto a riqueza nacional tem crescido a olhos vistos, o mesmo não se pode dizer ao avaliar seus indicadores sociais. Quando se comparam os números brasileiros relacionados a saúde, educação e inovação com os de outras nações, o país continua na rabeira, perdendo para vizinhos, como Chile e Argentina, ou nações do leste europeu, como Estônia e Eslováquia.

O Brasil já foi convidado para fazer parte da OCDE, organização que reúne 34 países, a maioria deles com economia forte e qualidade de vida. No primeiro quesito os brasileiros estão em condição privilegiada, visto que no fim de 2011 uma empresa de consultoria britânica colocou o país à frente do Reino Unido, que desceu para o sétimo lugar no ranking das maiores economias do mundo. Já no segundo item, ainda há muito o que avançar. Relatórios divulgados pela própria OCDE no ano passado indicam que em três áreas o país mantém indicadores que em nada condizem com seu crescimento econômico.


Acesso à educação

Uma delas é a educação. De acordo com a OCDE, em 2009, só 41% dos brasileiros com idade entre 25 e 64 anos de idade haviam concluído o ensino secundário, equivalente ao ensino médio. Na Eslo­­vá­­quia e na República Tcheca, países europeus com uma economia mais fragilizada que a do Brasil, esse porcentual chega a 91%. Já os que terminaram o ensino superior representam apenas 11%. Na Rússia, mais da metade da população nessa faixa etária (54%) fez curso superior.

“Relegar a educação a segundo plano foi o maior erro coletivo do Brasil”, avalia Priscila Cruz, diretora-executiva do Movimento Todos pela Educação, que tem como objetivo ampliar o acesso à educação básica de qualidade. Na opinião dela, o Brasil tem até avançado em alguns aspectos ao longo dos últimos 20 anos, mas em ritmo lento. “Conseguimos colocar grande parte das crianças na educação básica, mas o abandono no ensino médio ainda é gigantesco. Temos 3,7 milhões de crianças e jovens em idade escolar fora da escola, o que equivale a toda a população do Uruguai”, compara.


Investimentos

Para Luciano Nakabashi, professor do Departamento de Eco­­nomia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), o Brasil não tem investido suficientemente nessa área. “Temos mais pessoas estudando, mas a qualidade do ensino ainda é baixa. Investir nessa área é fundamental para que o país tenha um crescimento elevado não apenas em sua economia”, avalia. Os poucos investimentos para estruturação da educação básica e formação de professores são alguns dos pontos fracos apontados.

A escassez de investimentos na educação fica evidente quando confrontados alguns números da OCDE. Dentre 40 países (os 34 da OCDE mais Brasil, África do Sul, Índia, Indonésia, China e Rússia.), o Brasil é o segundo com o menor volume de gastos por estudante. Entre recursos públicos e privados, despendeu-se 2.416 dólares por aluno brasileiro em 2008. Na Suíça, país que aparece na primeira colocação, o valor gasto por estudante é de 14.977 dólares, ou seja, cinco vezes mais. “É necessário investir sobretudo na formação dos professores”, entende Fernanda Simões da Silva, diretora de políticas e projetos educacionais da Secretaria Estadual de Educação do Paraná.


Pouca inovação e pesquisadores em falta

Se no campo social o Brasil ainda faz feio diante dos membros da OCDE, na área de inovação tecnológica o país não tem um desempenho muito superior. O relatório da organização sobre esse segmento revela a mesma discrepância verificada nas áreas de saúde e educação. O número de patentes, marcas registradas (trademarks) e doutores em atividade são ínfimos perto do que dispõem outras nações desenvolvidas.

Exemplo gritante é a quantidade de patentes (direitos exclusivos sobre uma invenção) e marcas registradas conferidas no país. Levantamento de 2009 indicou a existência de uma marca registrada per capita no Brasil, enquanto a média de patentes ficou em zero. Na Suíça esse número foi de 221 marcas e 115 patentes. Até mesmo a África do Sul obteve um desempenho superior, com três marcas e uma patente registradas por pessoa.


Ousadia

O presidente da Associação Nacional de Pesquisa e Desenvol­­vimento das Empresas Inovado­­ras (Anpei), Carlos Eduardo Cal­­manovici, reconhece que os avanços ainda são pequenos quando comparados ao potencial econômico do Brasil. “In­­vestir em inovação representa um risco, tanto tecnológico quanto comercial. Por isso, algumas empresas ainda não reconhecem o seu valor. O país precisa de investimentos e políticas públicas mais ousadas, que sirvam de estímulo à inovação. Hoje vivemos um momento bom, com uma economia forte, que nos dá suporte para isso”, avalia.

Uma das explicações para a baixa produção científica está na quantidade igualmente reduzida de pessoas com doutorado no país. De acordo com a OCDE, o Brasil tinha em 2009 0,6% de doutores na faixa etária compatível com esses estudos. O relatório não especifica qual é essa faixa etária, mas nas universidades brasileiras a formação de doutores é completada geralmente depois dos 30 anos. Na Suíça o porcentual era de 3,4%.

Calmanovici concorda que a deficiência de mão de obra é um dos fatores que mais pesam nos baixos índices de inovação. “A inovação exige um profissional altamente qualificado. É preciso não apenas competência técnica, mas que seja um pesquisador entendedor, com sentido e noção do mercado. Apesar da qualidade das nossas universidades, ainda existe dificuldade para formar esse profissional”, diz.


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